quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Reflexões sobre o Natal

O Natal não é uma festa cristã, do jeito que celebramos hoje. Existiam festas pagãs com ceias e trocas de presentes antes do nascimento de Cristo, muito parecidas com nossos ritos atuais. Há até quem diga que Cristo não nasceu em dezembro e sim em abril. Seria então ariano ou taurino e não sagitariano. E teria morrido próximo a data do seu aniversário de 33 anos, também em abril.

Por que o Natal se reduziu a pinheiros, presentes e papais-noéis? Por que esse desejo coletivo incontrolável por i-pods, i-pads, i-pigs e outros ais?...Em janeiro, vira tudo um ai-meu-deus-como-vou-pagar-o-cartão?
Está bem, mas o Natal também é uma festa família. As pessoas se reúnem ao redor da mesa. Muitas vezes pela primeira e única vez no ano. E que seja. Antes isso do que nem isso.

Normalmente ficamos mais sensíveis, mais solidários, mais generosos. Também ficamos mais estressados, mais comilões, beberrões e perdulários... Fazer o quê? Como resistir?

Esta semana uma professora de Yoga me questionou sobre o sentido do Natal. Passei os dias seguintes refletindo sobre o que ela me disse. Afinal, por que damos presentes massificados e industrializados? Por que não damos mais cartões escritos a mão e peças de artesanato feitas por nós mesmos? Um potinho de geléia decorado com um lacinho ou um sabonete pintado a mão? Por que complicamos o que deveria ser tão simples?

Não deu tempo de refazer meus presentes, mas decidi não comprar árvore de natal este ano. Afinal, moro no nordeste Brasil. Aqui não tem pinheiro! Nem neve! Vi um de verdade num supermercado e quase comprei. Mas quando cheguei perto, achei-o tão frio, tão feio e tão agressivo. O pinheiro de natal tem espinhos! Como pode? Quero uma árvore que me abrace e acalente e não que me agrida!

Mas,  como gosto de enfeitar a casa para o Natal, acabei comprando uma planta. Muito bonitinha até. Enchi minha plantinha de bolas coloridas, com a ajuda das pessoas queridas que Deus pôs no meu caminho. Ficaram lindas! Estão parecendo laranjas psicodélicas. Adorei!

Havia árvore de natal no estábulo em que Jesus nasceu? Certamente não. Tampouco havia bolas coloridas, faixas e pinheiros. Havia só a luz da Lua, que imagino cheia. As estrelas no céu e os pastores na terra. Ovelhas, bois, vacas e pessoas de boa vontade.

Havia os três Reis Magos. Somente esses deram presentes ao menino-Deus. Ouro, incenso e mirra. Cada um deles ofereceu o que tinha de melhor. Esse deveria ser o sentido do Natal.

Seria bom voltar a simplicidade. Seria possível? Sugiro fazer um Natal mais calmo. Menos presentes, mais abraços. Troquemos os presentes por um novo futuro. O desperdício pela solidariedade. A correria pela Paz! O falatório pelo diálogo. Ao invés de comer e beber até cair, assistir ao nascimento do Sol e agradecer ao Divino pela maravilhosa experiência que é viver.
Feliz Natal para todos! Feliz Celebração da Vida! Feliz Renascimento da Esperança!




quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Minha relação com o futebol

Tudo começou em 1978 - Copa do Mundo da Argentina. Primeiro jogo que eu assisti.
Tínhamos uma TV pequena, preto-e-branco. Minha mãe estava de folga e me ensinava o que era futebol e o que era aquela paixão insana que o brasileiro tem pela Copa do Mundo.

Para mim, todos os jogadores eram iguais. Em preto-e-branco era dificil discernir quem era quem. O Brasil jogou de amarelo e a Suécia, de azul. Mas isso eu só descobri no You Tube. Muitos anos depois.

Minha mãe me explicou que 'Gol" era quando a bola entrava naquela rede quadrada que era defendida por um cara chamado goleiro. Cada time tinha um goleiro. Se a bola entrasse no gol da Suécia, era para gritar um GOOOOOOOOOOOOOOOOOL bem alto, porque o gol era na verdade, do Brasil! Achei meio confuso, mas tudo bem.

Saiu o primeiro gol. Eu gritei. GOOOOOOOOOOOOOOOOOOL!!!
-NÃO, menina!!!! Foi gol da Suécia!!!!
- Ih!!! Desculpe.......

No finalzinho do primeiro tempo, o Brasil fez um gol. Aí eu não comemorei. Fiquei com medo de errar. Minha mãe se esgoelou até ficar rouca e eu não entendi mais nada.... Ela ainda brigou comigo, dizendo que eu estava torcendo para o inimigo!

Anos se passaram. Minha mãe trocou de time. Antes, era botafoguense como o resto da família. Virou flamenguista quando trocou de marido. Era uma pressão danada. Eu tinha que ser botafoguense porque toda a família era. Pai, tios, avós...Mas alvinegros não eram autorizados lá em casa. Como nunca gostei de confusão, preferi virar torcedora apenas em copas do Mundo.

Eram acontecimentos! Enfeitávamos a rua. As casas ficavam cheias de bandeirinhas. Tinha concurso entre as ruas de Guadalupe (bairro da periferia do Rio) para ver quem eram os vizinhos mais criativos.  Em 1986 o pintor da nossa rua desenhou o laranjito no asfalto. Ficou lindo!

Desde 1978, não perco uma Copa. Agora sei onde é o gol que o Brasil tem que atacar. Sei o que o juiz faz e sei até discernir se o bandeirinha apontou um impedimento corretamente ou não! Ainda não sei a diferença entre Volante e Atacante, nem decoro a escalação do meu time, mas estou progredindo!

Quando meu filho cresceu, decidiu ser vascaíno. Foi outra polêmica! A essa altura, todo o núcleo familiar era flamenguista. Exceto eu, que permanecia neutra. Mas achava o uniforme do Vasco lindo!

Lá pelos anos dois mil e qualquer coisa, conheci um tal de Rogério Ceni. Um goleiro artilheiro do São Paulo. Pronto! Decidi! Sou Sãopaulina desde criancinha! Torci pelo São Paulo por uns dois campeonatos. Até hoje, continua sendo meu segundo time do coração.

Para acompanhar meu filho e participar um pouco mais da vida dele, decidi ser vascaína. Aprendi finalmente a ser torcedora. Sofro, choro e rôo as unhas. Grito até ficar rouca e xingo o juiz, que afinal, é sempre ladrão...

Domingo que vem é a final do Campeonato Brasileiro. O Vasco vai jogar contra o Flamengo, mas na verdade tem que ganhar do Corinthians... Da mídia, dos cartolas e dos juízes ladrões... Difícil explicar isso!

Vai ser o jogo do século. Se o Corinthians ganhar o campeonato, nenhuma surpresa. Terá feito sua obrigação, já que tem o apoio de todas as estrelas do céu e de todos os deuses do Olimpo. Mesmo assim, o Vasco terá sido o time mais guerreiro do campeonato.

Se o Vasco ganhar.... Aí, meu irmão, faremos história. Será uma grande lição de amor a camisa.
Vamos torcer!!

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Hoy es una mujer que se da cuenta de su alma

A primeira vez que ouvi essa canção foi num cd que ganhei de presente de um amigo muito querido. Passou a ser um dos meus temas. É ótima para ouvir naqueles dias em que estamos precisando de uma injeção de auto-estima. Enquanto tomas um café com suas amigas, presta atenção na letra e ouve a música.
Clipe - Ella (Bebe)

Ella

(Bebe)
Ella se ha cansado de tirar la toalla
Se va quitando poco a poco telarañas
No ha dormido esta noche
Pero no está cansada
No miró a ningún espejo
Pero se siente toa guapa

Hoy ella se ha puesto color en las pestañas
Hoy le gusta su sonrisa
No se siente una extraña
Hoy sueña lo que quiere sin preocuparse por nada
Hoy es una mujer que se da cuenta de su alma

Hoy vas a descubrir que el mundo es solo para ti
Que nadie puede hacerte daño
Nadie puede hacerte daño
Hoy vas a comprender que el miedo
Se puede romper con un solo portazo

Hoy vas a hacer reír porque tus ojos
Se han cansado de ser llanto, de ser llanto
Hoy vas a conseguir reírte hasta de ti
Y ver que lo haz logrado
Hoy vas a ser la mujer que te dé la gana de ser
Hoy te vas a querer
Como nadie te ha sabido querer
Hoy vas a mirar pa'lante
Que pa atrás ya te dolió bastante

Una mujer valiente, una mujer sonriente
Mira como pasa
Hoy no ha sido la mujer perfecta
Que esperaban a rotos sin pudores
Las reglas marcadas
Hoy ha calzado tacones para hacer sonar sus pasos
Hoy sabe que su vida nunca más será un fracaso
Hoy vas a descubrir que el mundo es solo para ti
Que nadie puede hacerte daño
Nadie puede hacerte daño
Hoy vas conquistar el cielo
Sin mirar lo alto que queda del suelo

Hoy vas a ser feliz aúnque el invierno sea frío
Y sea largo, y sea largo
Hoy vas a conseguir reírte hasta de ti
Y ver que lo haz logrado

Hoy vas a descubrir que el mundo es solo para ti
Que nadie puede hacerte daño
Nadie puede hacerte daño
Hoy vas a comprender que el miedo
Se puede romper con un solo portazo

Hoy vas a hacer reír porque tus ojos
Se han cansado de ser llanto, de ser llanto
Hoy vas a conseguir reírte hasta de ti
Y ver que lo haz logrado

domingo, 24 de julho de 2011

A roda da fortuna e os ciclos da vida

Sempre que pensamos em fortuna, lembramos de riqueza. João ganhou uma fortuna na mega sena. Esse carro vai me custar uma fortuna.


Na realidade, Fortuna é uma deusa romana. A carta do tarot: “A roda da fortuna” faz menção a ela. O que é fortuna, afinal? É o destino. Por alguns, chamado de sorte. Um mito criado pelo homem para explicar os reveses da vida.

A roda da fortuna é um círculo que não para de girar. Um dia estamos em cima, no outro estamos em baixo. Um dia estamos ricos, no outro pobres. Um dia temos saúde, no outro não. Um dia temos amigos, no outro, estamos sós. Um dia temos certas prioridades, no outro elas não parecem mais tão importantes. Só a nossa essência se preserva.

O melhor lugar para se estar é no centro da roda. O centro é estável. É a casa da essência do ser. Não muda, não gira. A partir do centro se tem uma perspectiva melhor do que se passa. Não sentimos a turbulência e ao mesmo tempo, podemos ver a roda girar. Podemos ver as mudanças sem ser afetados por elas. É o caminho do meio, a maturidade, a máxima sabedoria que só se alcança após girar várias e várias vezes.

Não é possível estar sempre no centro da roda. No entorno está toda a violência da mudança. É como andar numa montanha russa. Tem que ter fôlego.

O senso comum sempre ensina a não se embriagar no êxtase da boa sorte e não se abater demais nas fases de vacas magras. “Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe.” Mais uma expressão inspirada na roda da fortuna. Ou seja, permaneça no centro do círculo e tenha calma. Todas as fases passam. Todas mesmo!

Comecei a escrever esse texto após refletir muito sobre os ciclos da vida. Os altos e baixos sempre fizeram e sempre farão parte da vida de todos nós. Com o tempo, eles não nos surpreendem mais. Não tenho mais a efusividade da minha adolescência, nem caio em depressão quando a roda me mergulha no fundo dos problemas. Sei que após um ciclo difícil, chega um outro venturoso. Após a doença, vem a saúde. Após a tempestade, vem sempre um lindo dia.

Porém, não dá para ser Pollyana o tempo todo. É preciso refletir sobre esses ciclos. Eles não devem se repetir. A vida deve ser uma espiral ascendente, não um círculo vicioso. Se há algo que sempre se repete do mesmo jeito, é por que não aprendemos nossa lição ainda. Se, contudo, a roda gira e em sua rota avança, então tudo está bem. Você está progredindo.

Esses dias descobri que a belíssima Carmina Burana, do compositor alemão Carl Orff, nada mais é que um conjunto de poemas do século XIII que ele transformou em ópera. O meu trecho favorito trata da nossa heroina, a Fortuna, e se chama “Carmina Burana - O Fortuna, Imperatrix Mundi” (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Carmina_burana).

Eu o convido a ouvir o trecho da ópera e refletir sobre os ciclos da sua vida. Estamos avançando ou estacionamos no tempo e no espaço?
Carmina Burana - Fortuna
Carmina_burana
 

terça-feira, 21 de junho de 2011

Liderança na prática

Afinal, o que é liderar? Inspirar, apoiar, monitorar, corrigir e reconhecer. É não ser perfeito e reconhecer isso. É ser... humano.

Parece simples, mas não é! Admitir um erro, mudar de rota, dar a mão e dar a bronca. Acertar a justa medida do amor e da disciplina. Ficar bravo, sorrir, chorar, vibrar, brigar, fazer silêncio. Tudo isso em benefício do outro. Sem necessariamente esperar retorno para si. Todo pai e mãe sabe do que estou falando. Os bons professores também.

No fundo todos somos líderes em algum momento da vida. Escolher fazer isso direito é que faz toda a diferença. Então? Que escolha estamos fazendo?
Every man must decide whether he will walk in the light of creative altruism or in the darkness of destructive selfishness. Life's most persistent and urgent question is, 'What are you doing for others?' .” (Martin Luther King Jr.)



 
Se nós líderes entendêssemos como somos capazes de impactar na vida dos nossos liderados, será que pensaríamos um pouco mais antes de agir? Será que seríamos mais humanos?

Pais e mães são líderes, sem nunca ter recebido treinamento para isso. Sem ter muita certeza se estão fazendo o que é certo. A boa notícia é que, de acordo com a Coca-Cola, os bons são a maioria. Isso significa que a maior parte dos pais conseguiu formar bem seus filhos. Nesse caso, os maus líderes são a exceção, não a regra... Hummmm. Isso me parece bom! Não gosto de Coca-Cola, mas confesso que a sacada é genial.

A humanidade produz de vez em quando alguns líderes dignos do título. E a maior razão da existência deles é ensinar. A quem? A nós, pobres mortais. O quê? Um pouco de humanidade.

Então...Só nos resta aprender...
“The ultimate measure of a man is not where he stands in moments of comfort and convenience, but where he stands at times of challenge and controversy.” Martin Luther King Jr., Strength to Love, 1963



.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Octavio - não vá para Paris!

Octavio Augusto de Ceva Antunes – Conde de Ceva

Quando o conheci era o louco e o gênio. Também era nobre. Vinha de uma linhagem de Condes.
Admirado por muitos, respeitado por todos e detestado por alguns. Procurava eu um orientador para minha dissertação de mestrado. Era eu idealista. Queria usar meus conhecimentos de Química em favor da Sociedade. Cumprir com o Juramento do Químico que eu de coração e alma conduzira na formatura da turma de 1994-1 em janeiro de 1998.
Aconselhada por conhecidos, marquei uma entrevista com o famoso Prof. Octavio. Soube que ele liderava uma pesquisa em busca da cura para a AIDS. Achei perfeito! Estudei tudo o que pude sobre o trabalho dele e agendei a entrevista.
A primeira coisa que ele me disse, antes mesmo do bom dia foi: Quem é essa morena linda, com esse batom tão atraente? Eu usava um batom vermelho e um vestido florido. Fiquei da cor do batom e pensei: Galante esse orientador. Acho que vou sair correndo...
Mas não o fiz. Entrei e a entrevista correu bastante descontraída. Cinquenta palavrões e dois maços de cigarros depois eu era virtualmente aluna do Octavio. Fiquei impressionada com a inteligência daquele homem. Fiquei inebriada com a possibilidade de fazer parte de algo realmente importante.
LABCAT 641. Amigos, chopps as sextas-feiras, Kibe do Nelson. Noites viradas, toneladas de artigos para ler, sábados e domingos solitários no IQ-UFRJ. Congressos, viagens e resenhas. E Patrícia. Inteligentíssima, linda, divertida. Minha amiga de muitas risadas, longas horas de reações e análises que não davam certo. Conselheira de cromatografia. Parceira no pileque de vinho que tomamos juntas no Congresso da SBQ de Poços de Caldas. Cúmplice das noites viradas e manhãs de óculos escuros nas palestras do X BMIQ lá em Floripa. Patrícia só dormia com a TV ligada. Eu... falava dormindo e detestava o barulho da TV. Que dupla nós fizemos!
Patrícia terminou o mestrado dela em um ano e meio. Quanto a mim... Bem, obviamente que não descobri a cura da AIDS! Quase dois anos de trabalho e não consegui sintetizar o aminoácido que eu queria. Ele deveria ter sido o tijolo essencial de uma enzima, chamada HIV-Protease. Um capricho dos mecanismos de reação e voilá... Sintetizei uma allilamina. Meu co-orientador vira-se para mim e diz: Well...E daí?
Lembro do Octavio me dizendo - A menos que você encontre uma aplicação para essa merda aí, não terá dissertação. Terá que começar tudo de novo.

Pesquisando daqui e dali, achei uma aplicação. Até que não era tão merdelítico assim. Meu composto era análogo ao princípio ativo de um antifúngico. Poderia ser útil a Sociedade, afterall...
Feliz por não ter que começar do zero e um pouco frustrada. Tive a sensação de ficar novamente nos bastidores, jamais conseguindo subir ao palco principal. Esse parece ser o destino. Está até no meu mapa astral. Não nasci para ser comissão de frente. Mas também não me faço de rogada. Não tem carnaval sem carnavalesco. Nem carro alegórico sem motorista, afinal de contas!

Dissertação defendida e um convite para ir para Maringá - PR. Octavio me escolhera para um projeto envolvendo Química Verde. Um sonho. Mas, de novo o destino virou o leme da minha vida e vim parar na Bahia.
Lembro do orgulho do Octavio quando soube onde eu iria trabalhar. Lembro dos seus valiosos conselhos. Lembro de como me descreveu com precisão o mundo corporativo, as grandes empresas e o que se espera de quem trabalha nelas.
Enquanto isso, quis o destino que Patrícia e Octavio se apaixonassem. Foi tão natural e delicado que não houve espanto. Não muito tempo depois, se casaram e tiveram um menino. Octavio então já era pai de duas belas moças. O menino viria a completar sua vida e a de Patrícia.
A cerveja, o cigarro e até os palavrões (ao menos parte deles) ficaram para trás. Patrícia chegou para inspirar Octavio e fazê-lo esperar mais da vida. Dois infartos. Duas impressionantes recuperações. Um filho. Sucesso profissional para ambos. Tudo estava indo muito bem.
Um convite para um evento de trabalho em Paris. E Patrícia com aquela sua mania de sempre acompanhar o marido em todas as suas viagens. Que orgulho tinha ela dele. E não era para menos. Eu já me emocionei vendo-o apresentar uma palestra sobre HIV. Ele era apaixonado por esse vírus. Dedicou anos de pesquisa. Ele era como o Prof Xavier. E o HIV, como Magneto. Um oponente, sem dúvida. Mas algo para se admirar. Na tela, aparecia a imagem em 3D do vírus. No palco, Octavio dissertando. Essa estrutura é linda e cruel. Ela me desafia. E é para ela que dedico essa palestra. Era mais ou menos assim que iniciava suas apresentações.
31 de maio de 2009. Assisto o jornal Nacional. O boing 737 da Air France, vôo AF-447 caiu no Oceano Atlântico, na metade do caminho entre o Rio de Janeiro e Paris. Havia brasileiros a bordo. Desligo a TV e vou dormir pensando. Mais uma tragédia. Terá sido falha humana? Terá sido mau tempo? Vou dormir.

01 de junho. Mensagens no Orkut. No e-mail. No celular. Amigos me ligam. Octavio estava lá. No AF-447. Num lampejo egoísta, primeiro nego a informação. Quem sabe ele perdeu o avião! Não! Amigos se despediram dele no aeroporto. Quem sabe Patrícia não foi? Não! Ela nunca o deixa viajar só. Quem sabe o menino ficou? Não, Lucy! Não! Estavam todos a bordo. Os três! Felizes e ansiosos para chegar.

Aí pensei na injustiça da vida. Logo agora que eles estavam tão felizes. Chorei. Meus amigos choraram. Choveram mensagens. Desejei que ao menos Patrícia tivesse ficado. Que egoísta que fui! Se ela estivesse aqui seria mais uma viúva da Air France, lutando pelo direito sagrado de sepultar seu marido. Eles se foram. Todos nós ficamos órfãos.

Quase dois anos. Desejo que vocês três estejam bem. Que tenham conseguido se encontrar do outro lado. Que estejam juntos e felizes. Fico imaginando vocês três sentados juntos. O bebê no meio. Patrícia, como sempre maternal, segurando a mãozinha do menino, para que não tenha medo. Ela mesma com muito medo. Patrícia tinha pânico de andar de elevador. Quem dirá de avião. Octavio, o cético, já poderia prever o pior, mas não tinha medo. Ou iria para o céu católico ou iria para o cosmos químico. No fim, tudo tende ao equilíbrio.

Imagino a dor que sentiram. O medo e o frio. Imagino suas almas atordoadas procurando uns aos outros sem entender o que se passava. O mar. Faz frio aqui. Não consigo soltar o cinto. Mamãe, estou com medo. Me dá a sua mão.... Está tudo bem agora, queridos. Vocês estão bem. Nós todos sentimos muitas saudades. Tenho muito orgulho de ter conhecido seres humanos tão ilustres. Tão especiais.

Sejam felizes e olhem por nós.

Octavio – ainda não descobrimos a cura. Aquela combinação de proteínas linda e cruel continua a assolar a humanidade. Talvez você possa inspirar novos pesquisadores. Idealistas como você.

Patrícia – Sua disciplina, coragem, determinação e suavidade são exemplos. A ANVISA não terá outras condessas. Descanse em paz. Mulher de Octavio, Condessa de Ceva, mãe de Matheus e amiga de todos nós.

Dedico este texto a todos os amigos do LAB 641.

Três mulheres no café

Numa mesa de café se sentam três jovens senhoras. Uma, recém separada ainda rumina as reminiscências de seu último amor. Por que dói tanto quebrar, se dói mais ainda tentar colar? A segunda, ainda solteira, não se prende a nada nem a ninguém. Acha graça do romantismo e não se vê preparada para colar-se ainda. Liberdade é seu nome. Seu apelido – Independência. A terceira, muito bem casada consola as demais. Repete frases feitas que ouviu de sua mãe. Um dia, quando menos esperarem, esbarrarão no amor de suas vidas. Deu certo para mim, dará certo para vocês também.


Um expresso, um capuccino, um café com leite e três brownies. Pouca coisa converge essas três.

A divorciada se lamenta e recebe consolo. A solteira se gaba e recebe admiração. A casada, dá conselhos. Afinal, é a única que está realmente completa (ou não...)

A conta, por favor. Hora de ir para casa. Para os travesseiros frios, para a balada da hora e para aquecer o jantar. A primeira, abraça o travesseiro e deseja estar na balada. A segunda, enquanto se maqueia pensa se não seria bom ter para quem aquecer o jantar. A terceira... desiste de aquecer o jantar, pois o marido vai se atrasar novamente com o trabalho e resolveu pedir um subway no escritório. Vai para cama...abraçar seus travesseiros frios.

No fim, somos todas iguais.

Jogando palavras no papel.

Já não escrevo em papel. Agora uso um teclado, uma tela, uma rede. As palavras, por sua vez, são as mesmas. Agora mais curtas. Abreviadas, cortadas, mutiladas. Neste tema sou tradicional. Não decepo palavras. Elas merecem ser escritas letra a letra. Ponto a vírgula. Exclamação. Interrogação.

Sobre o que escrever afinal? Sobre minha inquietude e vontade de abraçar o mundo todo ao mesmo tempo agora? Sobre a inquietude do mundo que ao invés de se abraçar se devora?